terça-feira, 10 de novembro de 2009

Alguém

Eu sou a presença que você quer esquecer

Sou o ódio e o amor

Sou o mais correto de todos

Dos errados o primeiro

Sou um pouco

Mas posso ser tudo

Posso ser bom

*

Sou ruim, na verdade

A felicidade que você sente eu posso ser

Depende de você

Ou de mim

Não sei

Sou perverso, maníaco

Sei ser assim

Sou um menino

Prefiro ser...

Às vezes tenho que ser grande

Mas prefiro moleque

Sem horários...

O tempo é meu

O tempo pode ser nosso

E assim poderemos ser

Seremos nós

Esquecidos

Com os músculos cansados e as pernas bambas

Ou sempre lembrados

Estamos longe

Sentindo a brisa

As horas não existem

E eu continuarei sendo a calma

A paz, um delírio que você teve

Talvez eu nem exista mesmo

Penso às vezes

Mas sinto que sou

Isso e certeza

Eu vou querer mais...

Eu quero mais de tudo que gosto

[Eu quero exagerar]

Eu quero contrariar

Não passar sem dar sinal

Sem ser vida

Sem ter vivido

Eu quero me embriagar de sensações

De coisas que fazem gozar

De formas angelicais, sim

De prazer

De todas as coisas do prazer

Das tardes de sol

Das coisas que te faz feliz

Da noite

Mais que do dia

Do silencio

Ou do barulho mais ensurdecedor que existe

Como as aventuras em festas

As maravilhas dos públicos

Como o silêncio do campo

Eu sei

Serei

Alguém

sábado, ‎11‎ de ‎julho‎ de ‎2009, ‏‎05:41:48

terça-feira, 19 de maio de 2009

Bom, depois de muito tempo resolvi aparecer. Muitas coisas aconteceram nestes últimos dois meses. Pode até não parecer, mas escrevi muito nesse tempo – não o quanto gostaria -, mas como tenho o hábito de descansar antes de estar cansado, acabo por não ter a mínima vontade de postar os escritos aqui. Sem contar o que foi produzido com papel e caneta, o que dá mais preguiça ainda.

Uma destas produções me chamou muito a atenção. Sentei na frente do computador para dar uma sapeada na net, sem nenhuma pretensão de escrever algo. Fuçando no orkut, e-mail, youtube, notícias e no blog dos outros... acabei por me deparar, não sei em qual blog, com umas poesias que me deram a sensação de tomar pedradas na testa. O nome desse genial poeta é Paulo Leminski, o estilo curto de se escrever também foi novidade para mim.

Então no mesmo instante, após ler dez, doze poesias de Leminski, abri o Word e comecei a despejar enxurradas de versos, no total quarenta poesias. Não com a mesma destreza de Paulo, mas, quem sabe, um dia chegarei lá, ou não...

Agora posto apenas quinze, pois ainda não é o momento de postar as outras. Espero que gostem.


*


A primeira vez se interessou
Da segunda adorou
Na quinta chorou
Na vigésima se internou


*


conheço o mundo
como a palma
do menor anão
que pode haver
no mundo


*


À noite me traga como um grão
por mais que eu não tente
não queira
ela, com tudo, me joga no chão


*



procuro
poesia
perfeita
para
parar
prefeito de
proferir falsas
profecias.


*


Às vezes hesito na palavra falada
peco por isso
mas exagero na palavra escrita


*


falo o que penso
calo o que falo
calo para falar
falo para pensar


*


Seios como sois lindo
olho e toco em vocês
sempre sorrindo!


*


passo os dias
como passam as horas
vejo as vistas
como as vejo lá fora


*


alma condenada
de mentor insano
regurgitar profecias
esse é meu plano


*


O jeito é fazer
o que não deve ser feito.

*


saio de mim
para viver
sem ter fim


*


Vinte e alguns anos
cheio e vazio de planos
vivendo como se fosse morrer
sempre até o dia amanhecer


*


Já não entendo direito
as palavras dos sujeitos
movem-se goela fora
tudo da boca pra fora
pra fora da boca
partindo do peito


*


Dormira para acordar
acordara para trabalhar
trabalhara para ganhar
ganhara para sustentar

contas a pagar.


*

penso em silencio
de tão alto fico surdo
castigo o papel
com poemas miúdos.

domingo, 8 de março de 2009

Um dia de saudades


Saberei eu para que haja de servir um coração

miúdo coração pequeno e fraco demais

existe para me fazer sofrer pela escuridão

quando passo a pensar em deusas orquestrais.


Procuro segui-las num momento que se fez apaixonante

daí em diante é uma estranheza no sentir que se faz estranhar

o frágil coração se estremece todo, se assusta e pede amante

enquanto você não sabe qual a melhor maneira de se portar.

 

Frente a frente você se depara com uma felicidade tão passageira

e quando vê: já passou; se foi, e você não conseguiu aproveitar

você pensa em todo o vivido até machucar, chega à quarta feira

a saudade aperta no dia de chuva com filmes e pipocas a deitar.

     

segunda-feira, 2 de março de 2009

Uns sintomas

 

 

para Camila Bugni,

uma pessoa que se deixa apaixonar.

 

 

O coração só faltou saltar-lhe da boca

Disparou a bater num ritmo descompassado

Sua freqüência respiratória aumentou por demais

 

Os pensamentos começaram a lhe confundir

Pelo susto uma súbita vontade de chorar

Muito logo chegou a vontade de sorrir

 

As pernas fraquejaram num breve instante

Pensou em falar a alguém, mas desistiu

Ninguém nunca entenderia o que ele sentiu

 

Nem ele mesmo entendia tais sensações

Alguém perguntou algo a ele que o assustou

Desentendeu palavra alguma, o coração disparou

 

Tentou responder; engasgou, a voz falhou

Mais calmo sentou-se, encostou-se à parede ao lado

Fechou os olhos e da testa enxugou o suor gelado

Viu uma mulher a pouco vista de olhos fechados

E concluiu:

Estava apaixonado

 

19/02/09-06:18

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Morte de um ator.

Ela era uma pessoa que gostava de estar em evidência sempre, adorava ser notada, sentia prazer em perceber os outros conversarem sendo ela o assunto. Para isso, viveu ao menos dez de seus trinta anos a inventar doenças, a zombar dos outros, a passar, de propósito, pelas calçadas das obras que encontrava nas ruas da cidade.

Chorava sem motivo para ganhar atenção, por vezes fingia desmaiar nos coletivos lotados e estapeava algum homem com aparência humilde ou bêbado enquanto gritava que estava sofrendo assédios sexuais.

Poucos os que realmente gostavam dela. Eram esses: sua família e dois ou três amigos (as). A maioria a aturava, pois ela tinha algo na sua personalidade que fazia as pessoas temerem-na.

Eis que a vida - pegadinha do malandro que é - lhe pregou uma peça no maior dia de evidência de sua vida, disse ela a mãe este ser o dia mais feliz de toda sua existência, dia do seu casamento.

Já no altar, junto do noivo, do padre, dos padrinhos e dos coroinhas, se sentido uma verdadeira deusa no meio de toda aquela armação ela repetia as palavras que o padre lhe soprara, na parte do juramento de fidelidade ao cônjuge. Quando, de repente, um peido, escandaloso e impossível de segurar lhe escapou das entranhas. O coroinha que mantinha os olhos na noiva explodiu em risadas, enquanto gritava:

- Ela peidou, ela peidou.

Ela olhou para os convidados. Nisso todos eles chegaram até a engasgar com a gargalhada. O som estridente das risadas ecoou por toda a igreja e penetrou de forma abrupta o seu cérebro. Ela olhou para cima e viu a escultura pregada na cruz ganhar vida de tanto rir.

Correu como louca pelo tapete vermelho, desceu as escadas da igreja, entrou no carro todo enfeitado com latinhas amarradas por cordinhas na parte traseira do automóvel e saiu cantando os pneus.

O carro foi encontrado, ela não, mas para sempre, para os convidados daquela cerimônia e suas próximas gerações, sua historia estará eternamente viva.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Contradições da vida

Durante toda sua vida se amaldiçoou por não ter um carro

mas com muita divida e suor, finalmente, o grande e feliz dia chegou

ao sair de casa para dirigir pela primeira vez não conseguiu se locomover porque o congestionamento dominou a cidade toda

arrependeu-se até o dia de sua morte por ter vendido sua velha bicicleta velha

nunca mais encontrou outra à venda.



domingo, 15 de fevereiro de 2009

à minha MUSA

Sinônimo de coisas ruins é tua fama
Discordo disso com razão:
maldita e perversa depravação

Isso que vêem em você
quando chega a claridade.
Todos negam seus prazeres,
até mesmo as lições
e a cada dia aumenta mais
Com o avanço da idade.

Talvez percebam um dia,
Em tu, as mais belas alegrias;
os mais sinceros amores;
a aproximação à nossa essência;
quando quem fala é o coração
Desimpedido do não!

Quando as portas das verdades
Abertas... –
Seja a causa o álcool...
ou a excitação,
A mentira inexiste
Se houver é para chegar à satisfação
Assim é livre de punição.

Em você o barulho dorme.
Seu silêncio acorda a alma
em busca da calma,
forçado pela natureza do ser;
De ser bicho, de ser cão!
Todos querem, todos vão!

Tímidos; assim nos apresentamos
antes do tempo e sem contá-lo
fazemos de ti nossa mãe
como aquela que balançando...
punha-nos a dormir...
A diferença são os seios...!
não são os mesmos
E sim dos amores que nos destes
tu és alegre, és celeste.

Você só carece de uma coisa...:
crianças, isso falta,
tão inocentes, verdadeiras,
dormem hoje, o seu sono tranqüilo,
o sono que você concede
Mas amanhã..., talvez depois de amanhã...
ao lhe conhecerem
Voltaram a ser crianças novamente
Elas receberão de você o maior presente
A leveza que o dia deixou de ter
ao se fazerem gente.



Por tudo isso e muito mais,
obrigado, NOITE, sempre quente.

sábado, 17 de janeiro de 2009

Carta de alforria.

Era madrugada, ela escrevia deitada sobre a cama, em seu quarto, num hotel de luxo no bairro dos Jardins:

Mãe, Hoje é um grande dia, mas não de alegrias como as que eu dera a você até hoje.

Tenho pouco tempo é não pretendo me estender. Apenas venho pedir-lhe clemências, e se conseguir, lembre-se somente de tudo que vira até este momento.

Recorde-se da menina que saiu de casa cedo para morar mais perto do trabalho. Da menina, independente, com coragem para fazer as coisas que fiz para vê-la feliz.

Da menina que quando chegava do trabalho ligava para mãe e conversava por horas com ela. Peço a você, mãe, não deixe as pessoas saberem quem eu sou, conte apenas as minhas atitudes até a data de hoje. Afinal, essas foram as verdades arquitetadas por mim e se você nunca soubesse disso, você morreria com elas.

Perdoe-me, não fui corajosa o bastante para enfrentar a vergonha da pessoa que mais amo no mundo.
Serei sempre a sua filinha.
Adeus.
Adriana.

Rasgou a folha do caderno, levantou da cama, deixou o papel sobre a cama, olhou no relógio e pegou as chaves na escrivaninha. Saiu apressada, com o olho avermelhado. No elevador, tentava colocar a folha dobrada em quatro partes dentro de um envelope amarelo e formal.

Ligou o carro, com as mãos meio tremulas saiu dirigindo um honda civic zero. O rádio tocava uma música agitada. No banco do passageiro estava o envelope e uma bolsa preta de couro. Ela colocou um velho CD para tocar, no disco podia se ler: Legião Urbana. Procurou uma música lenta, achou Giz. Nos primeiros versos lagrimas começaram a descer dos seus olhos, ela passou a mão no rosto enquanto sussurrava a letra da canção e, ao mesmo tempo, chorava oprimidamente.

Atravessou a cidade em pouco tempo, o dia estava ameaçando amanhecer. Estacionou o carro na frente dum prédio antigo, pegou o envelope, saiu do carro e com o mesmo molho de chaves abriu o portão.

Nas escadas as pernas bambeavam mesmo em lento esforço para se chegar ao andar. O número grafado a tinta na parede a fez abrir uma porta, deu de cara com outras duas. Parou, respirou profundamente, sentiu como se um raio fosse despejado em sua cabeça. O claro debaixo da fresta anunciava o romper do dia. Agachou lentamente e passou o envelope para o outro lado. Ao levantar sentiu uma tontura e pensou que desmaiaria, debruçou-se na parede e sugou o máximo de ar possível - não desmaiou.

Correu pelas escadas, soluçava como uma pessoa aterrorizada. Na entrada do prédio foi interpelada por um senhor, com um saco de pães na mão. Não ouviu e na verdade nem viu o senhor perguntar a ela o que houvera.

Entrou no carro, a música tocava, mas a letra não poderia ser mais entendida por ela, seu estado de inconsciência não permitira isso. Um pouco mais calma, viu-se descendo do carro, na garagem do hotel. A bolsa no banco do passageiro permaneceu no mesmo lugar, ela saiu apenas com as chaves. Tomou o elevador, os ponteiros do seu relógio marcavam exatas seis horas. Ninguém no elevador, pois os moradores não possuem o hábito de transitar por estas horas.

A chave não penetrava a porta. Com imensa dificuldade conseguiu abri-la e se jogou na cama, enquanto soluçava, e de tanto soluço parecia que iria desfalecer, se contorcia, se debatia, se arrependia de ter nascido.

Levantou da cama, se pôs em frente o espelho, se olhou, permaneceu assim por alguns minutos, mas não notou o tempo passar. Puxou bruscamente a gaveta da mobília instalada abaixo do refletor. E retirou um objeto envolvido por uma flanela azul, desembrulhou o objeto, encaixou-o na mão direita, levantou o braço até a altura da cabeça. A mão e a cabeça eram separadas apenas pelo ferro cromado em prata.

Ela respirou fundo; fechou os olhos e não titubeou. De fora de seu apartamento foi possível escutar o disparo áspero e seco. Mesmo com uma queda violenta o chão foi o seu limite.

O relógio despertou às oito horas em ponto. De prontidão a senhora abriu os olhos e desligou o alarme. Levantou-se, de camisola foi até o banheiro, urinou, lavou o rosto e caminhou á cozinha, passou despercebida pelo envelope. Ligou a televisão em cima da mesa e pegou os apetrechos para preparar o café, feito sempre de maneira prosaica.

A água esquentava, nisso resolveu ir trocar de roupa. A caminho do quarto chutou, sem querer, o envelope amarelo. Estranhou. Pegou na mão e olhou em volta dele, não viu nada mais do que duas palavras, dentre uma dessas um nome feminino desconhecido.

Ainda então não havia entendido nada do que o jornalista falara, nem mesmo as propagandas anunciadas. Abriu o envelope, achou um pouco grande para a pequena folha que guardava. Desfez as dobras da carta e começou a ler.

Não entendeu o que a filha quisera dizer com aquelas palavras. Pensou em pegar o telefone, mas desistiu, estava muito cedo. Quando leu a falta de tempo da filha começou a se preocupar. As desculpas; os perdões; por quê? Não entendia e se perguntava. Sentou na cadeira encostada a parede e sentiu um estremecer no seu corpo, de repente uma sensação horrível dominava o seu juízo.

Ao resvalar o olhar que ficara imóvel por uns segundos pela televisão, viu uma foto de Adriana, foto que ela mesma tirara. Em seguida se ajoelhou em frente à televisão, e começou escutar a matéria:

É encontrada morta, com um tiro no lado direito da cabeça, Adriana Ferreira Batista, garota de programa. Aparentemente sua morte foi provocada por suicídio. A polícia civil faz investigações acerca do caso para confirmar as suspeitas. Sabrina, como era conhecida em seu meio profissional, foi presa no início desta madrugada, com o cantor Samuel, vocalista da banda X. Os dois estavam totalmente embriagados e portavam, no carro do cantor, 300 gramas de cocaína. Os advogados de Samuel entraram com pedido de habeas-corpus, os dois foram soltos para aguardar o julgamento em liberdade. O cantor aguarda o julgamento. Adriana foi encontrada morta às seis e dezessete.


quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

O INEVITÁVEL.

Rita, mais uma vez, saíra de casa para o trabalho e com um beijo na testa se despedira do marido que dormia um sono profundo, todos os dias são assim, Rita entra três horas antes de Carlos. Ela prefere, pois ao voltar a casa consegue arrumá-la por completo e ainda faz a janta - tudo sozinha, acompanhada apenas pelo silêncio de seus pensamentos.

Casada desde os vinte e quatro anos, Rita já é uma mulher, apesar de manter a aparência de portar perto dos vinte e cinco, ela tem trinta, trinta e um. Principalmente o seu rosto não fora ferido pelas cicatrizes que o tempo insiste em nos presentear. Aliás, o corpo também permanece o mesmo, senão poucos quilos a mais, mas tais quilos só deixaram Rita mais bonita e vistosa. Sempre bonita, mas antes se achava muito magra e só de uns tempos conseguiu engordar.
No caminho do trabalho, dentro do trem, Rita percebe alguns meninos, às vezes moços e até mesmo velhos encarando-a, e sempre sentira a mesma timidez; baixa a cabeça - ou disfarça o olhar bem rapidamente para outra direção como se não percebesse a vontade que esses homens sentiam de despi-la.

Aos quinze anos, época em que suas primas e amigas do colégio começaram a sair, Rita preferira a pintura. Vez ou outra ela fora as festinhas, às vezes se arriscava, em quase todas se arrependia e não foi fácil gostar das poucas festinhas em que fora: caras idiotas, com as mesmas conversas, meninas bêbadas fazendo sexo com os rapazes sem ao menos se conhecerem – era o que pensava. E num inesperado dia, depois de tanta decepção, ela conheceu Carlos, um rapaz da mesma idade, namoraram seis meses e se casaram apaixonados, na época gostavam das mesmas músicas, os mesmos filmes e cursavam a mesma faculdade.
Não era só na ida ao trabalho que Rita se fizera corar. No escritório, um dos chefes lhe tentara agradar com chocolates, flores e outras lisonjas. Ficara envergonhada todas às vezes e nunca aceitara os convites de almoço propostos pelo galanteador. Após o almoço era a entrega das compras do escritório, umas porções de entregadores tentavam conseguir o seu telefone, ela dizia para eles pararem senão contaria ao chefe. E isso poderia resultar numa possível demissão, visto que um dos encarregados era apaixonado pela dama - logo eles pararam.

Não é de hoje que Rita é assim tão cortejada, talvez isso se dê pela sua introversão mantida junto da simpatia, simpatia esta como a de um botão de rosa no ápice da primavera. Uma mulher que sempre teve pretendente a sua espera e nunca um amigo com quem ela pudesse contar para se abrir, as suas amizades foram só femininas.

Hoje, o casamento de Rita não é mais o mesmo, não que ela previra isto. E dentre tantos homens nos trens da vida, um; um dia, chamou-lhe atenção.

A tarde estava calma, um leve nublado no céu e gotas, tênue, tocavam o chão, no transporte nenhum banco desocupado. Rita estivera, naquele momento, com um filme em sua cabeça, sobre a sua vida, o seu futuro, presente e passado; pensava nos sonhos deixados para trás; nas viagens que prometera a si mesma e, até então, não houvera cumprido – por empecilhos da vida, do trabalho, do marido.
Neste momento, é interrompida por um rapaz sentado a sua frente, ele diz algumas palavras e só na segunda repetição ela entende. Rita senta e agradece a oferta do acento com um obrigado tímido e um sorriso delicado. Percebe, no rapaz, uma sinceridade inigualável, um homem olhou nos seus olhos. Discretamente o observa, por instantes tenta adivinhar seus pensamentos. Nota ser observada também, mas finge não perceber. Os olhos por poucas vezes se cruzam e mostram-se eufóricos, tímidos e palpitantes.

A caminho da outra plataforma, para transferência de trens, Rita pensa no quanto fora estranho às sensações que tivera por causa de um menino e um bom gesto, mas logo luta contra o pensamento, na procura de dispersar-se destas sensações.

Ao entrar no vagão se escora na parede devido à escassez de bancos e olha para o lado, se depara com o rapaz. Intimida-se. Sustenta o olhar assustado, dois, três segundos, vira de súbito o rosto, seu coração inicia uma batida irregular como se fosse parar. As batidas aumentam quando, ao olhar na direção do menino, vê ele se aproximar.

Luis chega, timidamente, se apresenta e comenta a coincidência. Rita sorri envergonhada, olha para todos os lados com medo e se certificar da ausência de conhecidos. Conversam mais, até que ela se despede e desembarca na parada seguinte, recusando o convite de almoço gaguejado por ele.

Como não era de se esperar, repetidas vezes o destino trabalhou para a consumação de um sentimento inevitável: a paixão. Impedido algumas vezes pela pessoa que jurou fidelidade e assinou um documento que formalizara o evento. Mas foi impossível não se render.

Enfim, é chegada à hora de ir embora, por rotina hoje é o dia de o escritório encerrar duas horas mais cedo o expediente, o dia que Rita planeja cada instante do seu tempo para aproveitar o máximo possível das horas de folga. No trem, ela devaneia em pensamentos doces, fica feliz e ampara um ar de pleno contentamento. De tão extasiada, não percebe os homens olhando-a, querendo possuí-la.

Agora, abraçada, ela delira, um delírio descompromissado com o tempo e com as convenções, quer amar, ser amada e é isso que fazem os dois. Deitada sobre o ombro dele e satisfeita, ela fala das coisas da vida, dos desencontros e da vontade de fugir deste mundo que só quer devorá-la, ele escuta com atenção e faz, com a mão, carinho em sua cabeça. Rita adormece.
Despertada por beijos e mais beijos Rita acorda ressaltada, se veste e se despede com beijos envolvidos por abraços numa mescla de euforia e saudade antecipada. Com passos rápidos ela anda em direção à rua de cima, onde fica a sua casa, pois se atrasou, e Carlos, seu esposo, está para chegar.